Ao tratar do assunto “conflitos de gerações”, a frase acima era freqüentemente citada por meu pai, no intuito de demonstrar que o relacionamento de pessoas de distintas gerações poderia ocorrer numa dimensão cooperativa e não antagônica.
Sua premissa era que seria possível disponibilizar um repertório comum de habilidades, experiências e conhecimentos, através do qual, cada geração compensaria suas vulnerabilidades apoiando-se nos pontos fortes da outra, gerando assim, benefícios mútuos.
Na prática, entretanto, é mais comum a ocorrência de uma danosa competição predatória, com resultados negativos para ambos os lados, ou, na melhor das hipóteses, atingindo a façanha da soma zero.
Poderíamos sintetizar os dois cenários anteriormente citados por meio das expressões“a tirania do OU e a genialidade do E”.
A primeira alternativa, “a tirania do OU”, descreve uma percepção que estabelece relações absolutas e excludentes do tipo “tudo ou nada”, “bom ou mau”, “certo ou errado”.
Partindo de uma visão maniqueísta, tende a acirrar o conflito de gerações, levando os integrantes de uma geração a desprezarem as virtudes da outra.
Esta postura preconceituosa distorce a realidade através de um artifício reducionista, desconsiderando que, entre os extremos “preto ou branco”, existem diferentes nuances. Por outro lado, a “genialidade do E” aponta para uma interação sinérgica, cuja resultante é maior que a mera somatória das partes.
Dentre os vários fatos que presenciei, comprovando esta tese, ressalto uma experiência que se tornou benchmark na década de 80: o Centro de Treinamento da Bayer, em Belford Roxo, no Rio de Janeiro.
O responsável pela área, sem verba para contratar professores, tomou a iniciativa de solicitar a disponibilização de colaboradores veteranos que estivessem a um horizonte de três a cinco anos de sua aposentadoria, a fim de convidá-los para atuar em seu Centro de Treinamento. Na outra ponta, celebrou um convênio com o SENAI da região, garantindo os alunos para o referido centro. Ao visitar aquela escola, pude constatar a “genialidade do E”, unindo professores e alunos, com um brilho nos olhos, característico de pessoas altamente motivadas. A relação entre aqueles mestres transmitindo uma experiência acumulada ao longo de décadas para um grupo de aprendizes receptivos não poderia ser melhor: ao cabo dos dois anos iniciais daquela feliz iniciativas. Todas as vagas de supervisor de primeira linha naquela Unidade Fabril foram supridas com os alunos egressos deste curso. Quantos problemas semelhantes poderiam ser solucionados, se exemplos como este fossem mais praticados?
Outra experiência que demonstra a sinergia potencial no relacionamento entre gerações foi desenvolvida na Inglaterra.
Com o objetivo de verificar quem dirigia melhor – os jovens ou os adultos – foi elaborado um teste, através de simulações virtuais, apresentando incidentes de trânsito, que requeria reações adequadas de cada participante que integrava uma amostra representativa dos referidos grupos etários.
Os resultados evidenciaram que os jovens tinham reflexos mais rápidos, mas os adultos previam com mais antecedência os riscos inerentes à cada situação e, dessa forma, envolviam-se em menor número de acidentes.
Também neste exemplo é possível observar que cada geração possui seus pontos fortes e suas limitações.
Se analisarmos do ponto de vista macro-econômico, o tema em questão revela a adoção de uma autêntica estratégia do desperdício em nosso país: de um lado, descartando prematuramente uma legião de aposentados e pessoas com dificuldade de recolocação profissional por motivo de idade. Ao fazê-lo, abre mão de um considerável lastro de conhecimentos e experiências, como se estivesse, metaforicamente, jogando o bebê fora junto com a água do banho.
Por outro lado, o tema leva-nos à conhecida dificuldade que os jovens têm para conquistar “um lugar ao sol” no mercado de trabalho. As oportunidades que surgem, freqüentemente são oferecidas sob a condição de que os candidatos preencham o requisito de uma experiência prévia comprovada. Tal exigência retarda a inclusão de milhares de jovens, a cada ano, supostamente incapazes de agregar valor por falta de maturidade.
Como se trata de um problema complexo, seu equacionamento requer uma profunda mudança de mentalidade e uma conjugação de esforços, em nível nacional, para que os reflexos positivos se façam sentir a médio e longo prazo.
Considerando que o tema enfocado acompanha a humanidade ao longo da história, por diferentes eras e muitas culturas, gostaria de concluir com as seguintes reflexões:
1 – O uso excessivo de um ponto forte poderá torná-lo vulnerável. Dito de outra forma, a diferença entre veneno e remédio é a dosagem;
2 – Se você ainda estiver vivendo a fase da geração jovem, procure relacionar-se com as pessoas das gerações mais velhas imaginando que, provavelmente, um dia você estará do outro lado;
3 – Se você já estiver vivendo tempos de maturidade, lembre-se das angústias e desafios que teve de enfrentar na primeira fase de sua vida, a fim de disponibilizar todo apoio que a geração jovem necessita para vencer;
4 – Numa ou noutra situação, o “procurar fazer aos outros aquilo que gostaríamos que os outros nos fizessem” certamente aguçará a nossa sensibilidade para que estabeleçamos relações de empatia com as pessoas de gerações distintas à da nossa.
Por Américo Marques Ferreira*
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*Américo Marques Ferreira é consultor do grupo MVC