Nas redes sociais, empresas criam SAC paralelo para conter internautas irados

4 de dezembro de 2012

Para responder a reclamações e comentários de consumidores nas redes sociais, empresas montam ‘torres de controle’, contratam atendentes com ensino superior e criam SAC mais ágil

No prédio da AgênciaClick Isobar, no bairro do Morumbi, em São Paulo, há uma sala apelidada de “torre de comando”. Nela, quatro grandes telas de LCD mostram tudo que qualquer internauta comenta sobre uma grande construtora, cliente da agência. Quatro funcionários ficam de olho nessas telas. Assim que alguém publica algo negativo sobre a empresa, eles entram em ação: em questão de minutos, respondem ao autor da queixa algo que possa acalmá-lo. Há algumas semanas, a torre de comando captou um movimento maior se formando em redes sociais como Facebook e Twitter.

Vários clientes da empresa começaram a reclamar do atraso na entrega das chaves de uma obra que deveria ficar pronta naquela data. A diretoria da agência foi acionada para criar uma “mini-campanha-relâmpago” com o objetivo de conter o início de crise. Tão logo a ação foi definida e o plano aprovado pela construtora, os clientes revoltados receberam uma mensagem direcionada especialmente a eles em seus perfis no Facebook. Também receberam telefonema e e-mail. Informados de que a empresa estava ciente da falha e empenhada em corrigir o problema, a crise que poderia prejudicar a imagem da construtora foi contornada em menos de quatro horas depois de detectada.

“As empresas precisam hoje ser tão rápidas quanto os consumidores”, diz Abel Reis, presidente da AgênciaClick Isobar. A urgência de resposta que as redes sociais demandam, segundo ele, acabou criando o que está sendo chamado de SAC 2.0.

Esqueça a atendente pouco entusiasmada do outro lado da linha dos tradicionais serviços de atendimento ao consumidor. O SAC 2.0 é diferente. “As empresas entenderam que para lidar com o consumidor que bota a boca no mundo por meio das redes sociais é preciso ter uma equipe especializada, mais bem preparada. Não pode ser o mesmo pessoal do SAC”, diz Maurício Vargas, fundador e diretor do site Reclame Aqui.

Em alguns casos, esse trabalho ainda é terceirizado, como na construtora cliente da Click Isobar e empresas como a Nestlé Brasil. Mas na maior parte das companhias, segundo Vargas, a equipe de monitoramento e atendimento a redes sociais é um departamento próprio. Os funcionários, em sua maioria, são estudantes universitários ou profissionais recém-formados. “Enquanto nos SACs a média salarial fica entre R$ 600 e R$ 700, no SAC 2.0 os funcionários ganham de R$ 1,8 mil a R$ 2 mil”, explica Vargas.

Superior Completo

A loja online de artigos esportivos Netshoes, uma das primeiras a montar uma equipe dedicada às redes sociais no País, em 2009, tem hoje um grupo de sete pessoas que ficam atentas ao que é falado sobre a companhia na web. Elas têm ensino superior completo, em geral, em Comunicação Social. “O funcionário tem de ser antenado e ter afinidade com o mundo virtual, para ser feliz nessa função”, diz Juliana Pires, gerente de relacionamento da empresa. O profissional dessa área tem acesso a vários departamentos da Netshoes e aos executivos de níveis superiores. Por isso, quando um usuário mandar uma mensagem furiosa na rede social reclamando do atraso da entrega de um tênis, é grande a chance de ser atendido mais rapidamente do que se reclamar por telefone.

“As respostas costumam ser mais rápidas quando a reclamação é feita via redes sociais porque no Twitter ou no Facebook os comentários estão ali para que todos vejam. No SAC tradicional a pessoa fala de um para um”, diz Felipe Wasserman, professor do Centro de Inovação e Criatividade da ESPM. O poder da propagação é ainda maior quando os posts são configurados para que todos vejam.

Mais do que a intenção de resolver o problema do cliente com rapidez, o que as empresas querem com essa agilidade é preservar sua marca. “A preocupação delas não é o consumidor em si, mas a imagem da companhia, que pode ser prejudicada”, diz Vargas, do Reclame Aqui.

Essa preocupação sempre existiu, mas hoje é ainda maior. É fácil entender o porquê. Atualmente, há 61 milhões de brasileiros no Facebook, segundo a consultoria comScore, e 40 milhões no Twitter, de acordo com a Semiocast. É comum as pessoas pedirem a opinião dos amigos nas redes antes de fazer uma compra, assim como pesquisar a reputação de uma marca em sites como o Reclame Aqui. “Recebemos 300 mil visitas diárias. Desse total, 5% são de pessoas que entram no site para reclamar. Os demais consultam opiniões sobre empresas e produtos”, conta Vargas.

Se à primeira vista as redes sociais assumiram um papel de algoz das empresas, olhando mais atentamente fica claro perceber que elas podem ser grandes aliadas. “Essas plataformas são também um canal de diálogo e relacionamento com o cliente”, afirma Wasserman, da ESPM. Quem consegue estabelecer uma conversa direta com os consumidores costuma se sobressair.

A empresa de TV por assinatura Sky tem aproveitado as redes sociais para conhecer melhor seus clientes. “É possível saber a demanda deles em relação à programação”, diz o vice-presidente de clientes da companhia, Vito Chiarella. “Além disso, expandimos nosso contato com a família do titular, já que quem faz o comentário no Twitter ou no Facebook geralmente é o filho.”

Será que o pessoal do SAC dá conta?

Há quem defenda que o dever de responder as reclamações em mídias sociais seja incorporado à rotina dos atendentes dos tradicionais Serviços de Atendimento ao Consumidor (SAC). É o caso da empresa Direct Talk, dona de uma ferramenta que monitora tudo o que é dito sobre uma marca nesses ambientes. Ela lançou recentemente um recurso que integra o software tradicional de atendimento ao cliente a um sistema de respostas a usuários do Twitter e do Facebook. Na visão da companhia, a crescente participação dos consumidores nas redes sociais cria a necessidade de dar aos profissionais que fazem o atendimento telefônico tradicional (sempre em maior número que a equipe de redes sociais) o poder de também interagir com os clientes na web. O desafio, porém, é garantir que esses funcionários tenham desenvoltura suficiente para conversar com os consumidores e escrevam corretamente o português.

Suco muito estranho

A carioca Ursula de Almeida encontrou um corpo estranho no suco Ades, da Unilever. “Liguei no SAC e a atendente não deu importância. Fui para o Facebook”. Em 15 dias, 226 mil pessoas compartilharam o comentário. A empresa disse que podia haver fissura na embalagem.

Seu Jorge reclama no YouTube

O cantor Seu Jorge postou na semana passada cinco vídeos gravados de dentro de um avião da TAM, com queixas sobre o atendimento da companhia. Seu voo teve um problema técnico, precisou voltar e ele acabou não comparecendo a um show. Em nota à imprensa, a TAM lamentou o transtorno.

Para agradar

Um usuário perguntou no Facebook se havia na Netshoes um tênis All-Star com estampa inspirada no arquiteto Oscar Niemeyer. A Netshoes respondeu que não vendia o modelo. Mas, para agradar o usuário, a empresa informou quais lojas vendiam.

Manual do SAC 2.0 para empresas

Como responder a reclamações em redes sociais:

– Fuja de respostas padrões: redes sociais não podem funcionar como SACs tradicionais. Facebook e Twitter são ambientes de interação social.

– Se a marca passa por um momento complicado, não banque o feliz na rede social. Expressões como “Bom dia, pessoal!” ou “Boa noite, gente” podem pegar mal.

– Fale também com o público mais maduro: a maioria das marcas acha que rede social é só para o público jovem. O público de 25 a 34 anos de idade responde por 32% da base de usuários no Brasil. Os de 35 a 44 anos, por 22%, segundo a comScore.

– As redes sociais também são um ambiente de informação. Se você tem um restaurante de comida italiana, por exemplo, faça da sua página um canto para receitas de pratos italianos. Os usuários o verão como especialistas no assunto.

Por LÍLIAN CUNHA , NAYARA FRAGA – O Estado de S.Paulo
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