A empresa de José Worcman ganha dinheiro detectando erros e falhas nos serviços prestados pelas empresas. Ele garante: o serviço de cliente oculto vai se tornar cada vez mais comum no Brasil
Criticar o cliente é um dos passatempos favoritos dos empresários – desde que ele não esteja por perto. José Worcman, 35 anos, é uma exceção. Ele ganha a vida justamente mostrando falhas, erros e pontos fracos no serviço e no atendimento de seus clientes. Worcman é o fundador da OnYou, empresa que fornece um tipo de serviço chamado cliente oculto. Tratam-se de pessoas anônimas que se misturam à clientela normal de um estabelecimento – hotel, restaurante ou cinema, por exemplo – e depois escreve um relatório minucioso descrevendo sua experiência. Uma espécie de detetives particulares, à caça de problemas. A partir de visitas regulares, essas empresas conseguem identificar – e resolver, espera-se – onde estão os principais problemas em sua interface com o público.
Aliás, chamar os relatórios de minuciosos é ser modesto. Cada visita pode gerar um calhamaço onde mais de 100 perguntas precisam ser respondidas. O roteiro dos clientes cocultos – gente anônima, desconhecida dos funcionários – pode incluir a averiguação de pontos como a temperatura da pipoca servida antes de um filme à precisão da arrumação da cama em um quarto de hotel. Não é a toa que cada um dos 35 mil clientes anônimos cadastrados pela OnYou passe por um treinamento online específico para o tipo de visita que irá realizar. Aliás, a remuneração paga aos clientes cultos pode cobrir desde o pagamento das despesas feitas no local até R$ 500, dependendo do tipo de serviço realizado. Em entrevista à NEGÓCIOS, Worcman fala sobre as perspectivas do cliente oculto no Brasil.
Como você começou a atuar com clientes ocultos?
Desde pequeno sou muito envolvido com hotelaria, porque meu pai era dono de uma pequena rede de hotéis. Me formei nessa área e fiquei trabalhando alguns anos em um hotel em Miami (EUA). E foi lá que tive contato com esse tipo de atividade, que é muito mais comum no exterior do que no Brasil. Vi de perto como a atuação do cliente oculto pode gerar uma melhora real nos serviços das empresas. Quando voltei ao Brasil, percebi que quase ninguém atuava nisso, e havia muito espaço para crescer. Eu e uma sócia juntamos as economias e abrimos a OnYou em 2006.
Quais setores mais usam esse tipo de serviço?
Quando começamos, quase todos nossos clientes eram hotéis. Depois passamos a atender muitos restaurantes, e hoje existe um equilíbrio meio a meio. Mas o próximo passo é a chegada do grande varejo, que já está começando. Temos grandes redes de cinema e de comércio de automóveis nos procurando.
Quanto o segmento de cliente oculto movimenta?
Segundo a associação americana do setor, a MSPA (Mystery Shopping Providers Association), por lá são cerca de US$ 1,5 bilhão por ano. Por aqui ainda não há registro desses valores, mas é possível dizer que é um setor em plena ascensão. A OnYou, por exemplo, dobrou de tamanho no ano passado. Temos cerca de 200 clientes e 35 mil clientes ocultos cadastrados.
O que explica esse crescimento?
As empresas nacionais estão começando a entender o valor de uma auditoria em seu relacionamento com o cliente. Há uma consciência que os serviços são um dos principais diferenciais em um ambiente de competição. E o cliente oculto proporciona exatamente isso: uma terceirização da gestão da qualidade do serviço, uma avaliação independente, idônea a precisa.
Há muita diferença no nível dos serviços no Brasil em relação aos EUA e a Europa?
Ainda ficamos muito atrás em termos de prática, nível educacional e treinamento de funcionários. Por outro lado, temos uma vantagem comparativa. De forma geral, o brasileiro é naturalmente caloroso, receptivo. Ele gosta de atender. Lá fora nem sempre é assim. Quem já foi a um restaurante na França ou na Espanha sabe que, por melhor que seja o treinamento, os atendentes podem ser bem complicados.
Como é concorrer com redes sociais que permitem a avaliação de serviços e atendimento das empresas?
Acho que são trabalhos complementares e não concorrentes. Redes e aplicativos podem até dar ao dono de empresas uma ideia ou sensação que as coisas não vão bem, mas é pouco preciso, é muito genérico. Já os nossos relatórios são extremamente precisos. Não basta dizer que “o prato demorou”, mas quantos minutos; que “o banheiro está sujo”, mas que isso significa papel espalhado pelo chão e três manchas na parede. A mesma coisa vale para funcionários. É pouco dizer que não foi bem atendido. É preciso especificar exatamente qual funcionário disse o quê. E ai entra desde a falta de um “bom dia” até uma falha no atendimento ou uma informação errada.
Isso não pode trazer problemas para o funcionário?
Se ele não estiver fazendo o serviço direito, paciência. Foi só com esse sistema que descobrimos, por exemplo, o caso de um hotel cliente nosso em que um atendente recomendava aos clientes que almoçassem no bar da esquina, ao invés do restaurante do hotel. E o mesmo sistema também permite que funcionários eficientes, que se destacam, recebam promoções e aumentos.
Fonte: http://epocanegocios.globo.com