A empresária Luiza Helena Trajano, presidente do Magazine Luiza, durante palestra na 13ª Feira Nacional do Livro de Ribeirão Preto
O relógio marcava 15h50, quando uma mulher de meia idade com um vestido azul marinho e sapatos pretos de salto baixo cruzou o salão de entrada do Theatro Pedro II, em Ribeirão Preto. Sorriso fácil, cumprimentos a todos que encontrava no caminho e conversas amigáveis. A postura da empresária francana Luiza Helena Trajano Rodrigues nem de longe revela sua importância na economia e no cenário político nacional. A presidente de uma das maiores redes de varejo do Brasil, o Magazine Luiza, mantém o jeito de quem cresceu no interior.
Convidada pela organização da 13ª Feira Internacional do Livro a proferir uma palestra, Luizinha, como é conhecida em Franca, chegou com 10 minutos de antecedência. Recebeu fãs no camarim, posou para fotos, concedeu entrevistas e, no horário marcado, foi direto para o palco. Sem anotações ou discursos prontos. A experiência mostrou a Luiza que a fala sem script é sempre melhor. “Nunca preparo o que vou falar. Deixo vir do coração”, disse.
A plateia que assistia atenta a empresária citar os números que fazem dela um fenômeno de administração (nos últimos dez anos, o Magazine Luiza saltou de 111 lojas, 3,3 mil funcionários e faturamento de R$ 700 milhões para 731 lojas, 23 mil empregados e faturamento de R$ 7,7 bilhões), duvidaria se ela revelasse a rotina simples que tem.
Desde que o comando da rede Magazine Luiza foi transferido de Franca para São Paulo, Luizinha fixou residência na capital paulista. Mora em um apartamento no Jardins. Foi de lá que viajou na noite de segunda-feira para Franca. Logo pela manhã, na terça-feira, aproveitou para visitar uma amiga antiga que sofre com um câncer. Conversaram por alguns minutos. Riam do passado e falaram sobre filhos. Depois, a empresária foi visitar sua tia Luiza, a fundadora da rede e que até hoje mantém residência em um casarão ao lado do loja número 1 do Magazine, bem no coração de Franca. Almoçaram juntas e trocaram experiência. “Acho sempre bom poder estar com a minha tia. Ela tem uma visão muito particular dos negócios. Sempre peço conselhos.” Foi depois do almoço que Luiza Helena seguiu para Ribeirão Preto. Convidada de honra para a tarde da Feira do Livro, sua palestra contou com a mediação do jornalista Corrêa Neves Júnior, diretor executivo do GCN, a quem ela chamou de amigo.
Luizinha figura na lista dos dez empresários com melhor reputação no Brasil, divulgada recentemente pela Revista Exame. Tem trânsito livre com a presidente Dilma Rousseff (PT), de quem se tornou uma amiga e conselheira. Ocupa a vice-presidência do Instituto para o Desenvolvimento do Varejo, entidade que congrega os 39 maiores varejistas do País que faturam juntos mais de R$ 100 bilhões por ano. Mas no palco do Theatro, o que se viu foi uma mulher com paixão pelo que faz e amor pelo País onde vive. Para abrir sua palestra, a empresária mostrou um vídeo com o Hino Nacional tocado e cantado em diversos ritmos regionais; da viola caipira de Minas e São Paulo, ao xote do Nordeste passando pelo samba do Rio. “Gente, não é linda essa riqueza cultural. Isso só existe no Brasil. Temos que valorizar nosso País.”
Com um jeito simples, Luizinha conseguiu traduzir para o público conceitos econômicos e de administração. Falou do seu encontro com o ex-presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton, em uma feira de negócios americana. “Ele me fez entender aquilo que eu usava na empresa sem saber o que era. Ele me ensinou que feedback é uma coisa para ser levada a sério. Não deve ser confundida com uma crítica pessoal. Cresci muito depois disso. Gosto de pessoas que sabem receber críticas e ouvem o que as outras têm para falar.”
Talvez seja por isso que Luiza faça questão de até hoje responder a todos os emails que recebe de clientes. “Dependo dessas pessoas. Não posso ignorá-las. O respeito com que são tratadas no Magazine faz toda a diferença. Podem não acreditar mas sou eu pessoalmente que respondo aos clientes. Quando o caso é muito sério, telefono diretamente para o consumidor para entender onde falhamos.”
Luiza começou a trabalhar na empresa de sua tia ainda jovem. Aos 12 anos, atendia os clientes no balcão. Ocupou diversos cargos até que em 1991 recebeu a missão de dirigir o Magazine Luiza. Formada em direito e administração, a jovem logo propôs mudanças. Atenta às transformações do mundo, investiu em tecnologia e em qualificação de pessoal. Criou aliados. Muitos a acompanham até hoje, como é o caso do diretor de compras, João Bosco Cordeiro.
Apaixonada pelo empreendedorismo, Luiza revelou sua receita para o sucesso nos negócios. “É preciso acreditar. Ter um objetivo claro. Traçar um plano e trabalhar. Muita gente vai dizer que não dará certo, mas você precisa acreditar no seu sonho e não desistir. As pesquisas mostram que 70% dos empresários vencedores começaram pobres mas com muita vontade de fazer diferença.”
À vontade com o público, Luiza lembrou de alguns momentos difíceis que precisou enfrentar. O primeiro foi a morte de seu marido Erasmo Fernandes Rodrigues, que faleceu no rancho da família em Cássia, Minas Gerais, no feriado de Finados de 2009. “Eu não sou uma pessoa depressiva. Não fico pensando muito nos problemas. Meu cérebro prefere pensar em soluções. Mas perder meu marido, que era mais que apenas um companheiro, era o meu porto seguro, foi um baque. Fui eu que o encontrei. Fiquei triste. Chorei. Tem coisa pior que ter de ligar para os filhos e avisar que o pai deles está morto? O que me salvou da depressão foi a paixão pelo que faço.” Pouco mais de um ano depois, mais um choque. Luiza Helena estava ao lado do primo e quase irmão Wagner Garcia quando ele morreu em julho de 2011. “Ele segurou minha mão e me pediu para que não deixasse ele morrer. Mas mesmo assim ele se foi. Nem sei como me senti.” Foi uma das poucas vezes que a empresária acostumada a dar palestras motivacionais falou sobre sua vida pessoal.
O tom triste logo foi substituído pela narrativa de casos em que Luiza aplicou a máxima que carrega desde que assumiu o comando do Magazine. “Aprendi que na vida a gente não pode querer ter sempre razão e brigar por causa disso. Às vezes, é muito melhor ser feliz”, disse, lembrando o slogan que está atrelado à rede Magazine.
Como boa vendedora, Luiza terminou a palestra mostrando um vídeo sobre o Magazine Luiza. “Precisamos vender. Comprem no Magazine.”
Depois, a empresária respondeu às perguntas feitas pelo público. Não fugiu de nenhum assunto. Mas ficou visivelmente desconfortável quando o jornalista Corrêa Neves Júnior a questionou sobre as negociações com a família Safra na venda das lojas do Ponto Frio, que acabou sendo fechada com o Grupo Pão de Açúcar, concorrente direto do Magazine. “A mídia quis me jogar contra o Abílio Diniz [que comandava o grupo à época], mas não tenho porque falar mal dele. Na minha opinião, não tinha que ser. Fui abençoada por Deus. Se tivéssemos comprado o Ponto Frio naquele momento, hoje nossa trajetória seria outra. Não existiria Lojas Maia nem as do Baú.”
A empresária também contou porque escolheu votar em Dilma Rousseff na última eleição presidencial em 2010. “Na época a Dilma era ministra de Estado. E como empresária, encontrei com ela em diversos eventos. Em todos, ela sempre discursava muito mal. Não conseguia envolver a plateia. Teve uma ocasião, perto do Dia das Mulheres, em que não aguentei e, com muita delicadeza, a procurei para tentar ajudar. Disse que os discursos não estavam bons e surpreendentemente ela ficou 40 minutos me perguntando como melhorar, o que deveria fazer. Fiquei admirada. Ela soube ouvir a minha crítica e ainda procurou conselhos para mudar. Me ganhou.”
Ainda sobre política, Luiza descartou qualquer possibilidade de disputar algum cargo público. “Não quero. Acho que contribuo mais trabalhando fora da política.” Ela ainda contou como foi o convite feito pela presidente Dilma para que ela assumisse a Secretaria da Micro e Pequena Empresa, hoje nas mãos do vice-governador de São Paulo Guilherme Afif Domingos. “Houve o convite há uns seis meses. Mas teria que abandonar tudo no Magazine Luiza. Expliquei que não poderia fazer isso neste momento. Preferi recusar.”
RETORNO
Depois da rodada de perguntas, Luiza que tinha uma reunião marcada na Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) de Franca, entidade que ajuda a conseguir recursos, se despediu do público.
Mesmo depois de encerrado o evento, a empresária ainda permaneceu no Theatro atendendo a todos que queriam conversar com ela. Posou para fotos, distribuiu autógrafos e abraços e ainda ouviu atentamente os elogios e pedidos de apoio.
Luiza deixou Franca na manhã de quarta-feira. Foi direto para Brasília onde lançou ao lado da presidente o novo programa “Minha Casa Melhor”, que libera financiamentos de até R$ 5 mil para a compra de móveis e eletrodomésticos.
Fonte: gcn.net.br