Bruna Camara tem 24 anos e concilia estágio, faculdade e uma recém-criada browneria, a quem se dedica principalmente nas poucas horas vagas do dia. Lorraine Souza tem 22 anos e largou o emprego em uma creche para montar o próprio salão de beleza. As duas reúnem características que formam o atual retrato da mulher empreendedora do Brasil: jovem, atenta ao mercado e otimista. É o que revelam os números das recentes pesquisas realizadas no país.
Segundo o Sebrae e o Global Entrepreneurship Monitor (GEM), as mulheres hoje são maioria entre os novos empreendedores: 52% dos empresários com menos de três anos e meio de atividade são do sexo feminino. Por essa razão, elas têm sido alvo constante de estudos sobre empreendedorismo.
A pesquisa do GEM aponta ainda que 66% das mulheres iniciam uma empresa após identificar uma oportunidade de mercado. Foi o caso de Bruna, que, quando criança, fazia doces para ajudar no buffet da madrinha. Aos 18 anos, sua escola recebeu uma competição promovida pela Junior Achievement (JA) e pelo Sebrae, em que os estudantes precisavam montar e gerir uma miniempresa. Ela gostou da brincadeira e passou a participar ativamente de eventos de empreendedorismo para jovens.
No ano passado, Bruna resolveu complementar a bolsa do estágio e a ajuda dos pais vendendo os doces que já eram sucesso entre seus amigos: palha italiana, torta alemã, bolos e brownies. Apesar da pouca idade, ela mostrou maturidade na hora de abrir sua empresa:
— Eu decidi apostar nos brownies porque eram os mais vendidos, mas não quis me aventurar. Antes de começar, fui pesquisar o mercado. Em Santa Cruz, onde moro, os brownies não são muito conhecidos, então fui ver como funcionavam algumas marcas que já existiam no mercado. É muito importante conhecer seu concorrente. Foi aí que tive certeza que meu produto tinha potencial, e que, com diferencial e qualidade, eu poderia aos poucos conquistar mais clientes. Foi assim que criei a Bruneria, minha empresa — conta a microempreendedora que oferece mais de 15 sabores do doce.
Outra pesquisa recente sobre o perfil das mulheres empreendedoras foi realizada pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) e pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas. Os números revelam que 72% das empresárias não trocariam seu negócio por um emprego de carteira assinada e carga horária fixa, mesmo que o salário fosse compatível com a renda da empresa.
— De jeito nenhum largo meu salão para voltar a ser funcionária. Eu fiz o caminho inverso e gostei muito. Deixei de trabalhar em creche porque queria ter a minha empresa. Mesmo que me ofereçam o mesmo, não topo. Aqui eu até trabalho mais, mas tenho mais flexibilidade e, o mais importante, gosto muito do que faço — compara Lorraine que, com 19 anos, abriu um salão na casa de sua mãe, no Santa Marta, na Zona Sul do Rio, onde também mora com o marido.
As mulheres ouvidas pela pesquisa do SPC destacaram persistência e confiança como as principais características que contribuíram para suas conquistas profissionais, o que mostra um perfil otimista da empreendedora brasileira. O otimismo também foi destacado no Anuário das Mulheres de 2013 do Sebrae:
— As mulheres são muito perseverantes e têm uma motivação muito forte na busca por resultado — analisa Ricardo Wargas, gerente de Soluções e Inovações do Sebrae/RJ.
Haja perseverança para Bruna que, para conciliar estágio e faculdade, dedica suas madrugadas e fins de semana à produção de seus brownies:
— Acredito que basta você enxergar uma oportunidade, se dedicar com todo o coração e correr atrás que as coisas acontecem.
A dedicação de Lorraine também é intensa, e ela já planeja fazer outros cursos de cabelo para se capacitar, mas precisa dividir seu tempo ainda com as tarefas domésticas, assim como 47% das entrevistadas pelo SPC que são as únicas responsáveis pelas tarefas do lar. Número que sobe para 58% quando se trata de empresárias informais.
— Meu marido até ajuda, mas sou eu quem cuido de quase tudo em casa — diz a cabeleireira, que divide as despesas do lar com ele e se junta aos 56% das mulheres empreendedoras do país que são tão responsáveis pelas contas da casa quanto os companheiros.
Apesar do aumento da atuação de mulheres no cenário empresarial do país, especialistas fazem ressalvas e dizem que elas têm muita batalha pela frente:
— O maior número de mulheres empreendedoras não se reflete ainda na igualdade entre os gêneros. As mulheres ainda são as que mais fazem dupla jornada, seja para conciliar um emprego assalariado com o negócio próprio ou para conciliar as tarefas do lar com a empresa — alerta a professora da FGV Carmen Migueles. – Elas sofreram e ainda sofrem desvantagens no mercado. Sempre receberam salários abaixo da média masculina. Isso gerou um comportamento de submissão que afeta os resultados financeiros das mulheres empreendedoras: elas tendem a ceder mais em negociações e acabam cobrando menos pelos seus serviços.
Fonte: O Globo