Consumo das famílias tem 1º recuo de quatro trimestres desde 2004

1 de setembro de 2015

consumo_classe_dO consumo das famílias entrou pela primeira vez – desde os primeiros três meses de 2004 – em terreno negativo no acumulado em quatro trimestres. Entre o primeiro e o segundo trimestres de 2015, esse componente do Produto Interno Bruto (PIB) passou de alta de 0,2% para retração de 0,6%, na comparação com o mesmo intervalo do ano anterior.

Diante das previsões de aumento do desemprego – nos próximos meses e em 2016 – e dos próprios efeitos defasados da desaceleração da atividade sobre o mercado de trabalho, o segundo semestre deste ano deve ser ainda pior que o primeiro, dizem economistas.

“Os principais determinantes do consumo das famílias continuaram piorando em julho e agosto. A massa de renda e o crédito à pessoa física têm queda real e a pesquisa do comércio de julho mostra de forma clara a manutenção da tendência de queda”, justifica o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves.

Nas contas do Fator, o componente deve encolher 2,4% em 2015 – se concretizado, o pior resultado da série das Contas Nacionais, que começa em 1996. Nos últimos 19 anos, o consumo das famílias caiu em anos fechados duas vezes, em 1998 e 2003, 0,7% em ambas as ocasiões.

O economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira, destaca a deterioração forte do mercado de trabalho neste e no próximo ano. A taxa de desemprego, que saltou de 5,3% para 7,5% de janeiro a julho, deve continuar subindo e chegar 9,5% na média de 2016. A economia formal, por sua vez, cortará 1,3 milhão de vagas com carteira assinada, conforme a projeção do Fibra para o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) deste ano. “A inflação continua acelerando, o nível de confiança está bastante baixo e a queda na concessão decrédito está entre as maiores dos últimos anos”, completa Oliveira.

Mais do que a desvalorização do câmbio, a retração do consumo, ao lado do tombo dos investimentos, está entre as principais responsáveis pela queda de 11,7% das importações sobre o segundo trimestre de 2014, ressalta Thaís Zara, economista-chefe da Rosenberg Associados, e pelo recuo importante da absorção doméstica, que “tirou” 5,3 pontos percentuais do PIB no segundo trimestre – a queda foi de 2,6% sobre os mesmos meses do ano passado.

“É esse recuo da absorção doméstica que proporciona essa sensação de queda tão forte da atividade entre os agentes econômicos”, comenta. É uma mudança significativa em relação ao padrão que vigorou nos últimos anos, avalia, quando a demanda interna crescia além da geração de riqueza doméstica, alimentada por importações. “E aí tínhamos aquela sensação de euforia.”

Após a divulgação dos números do IBGE na sexta-feira, a consultoria revisou para baixo a expectativa para o produto no ano de queda de 2% para contração de 2,5%. A projeção para o ano que vem passou de estabilidade para queda de 0,5%.

Depois de encolher 2,1 % de abril a junho, o consumo das famílias vai cair 2,4% no terceiro trimestre, em relação ao período anterior, descontados os efeitos sazonais, de acordo com as estimativas da GO Associados, e 3,7% neste ano – contração ainda maior que a projetada para o PIB, que passou de 2% para 3%.

Sem alívio na taxa de desemprego ou perspectiva de afrouxamento do crédito, pondera Gonçalves, do Fator, a desaceleração da inflação pode dar ajuda importante ao consumo em 2016. A convergência do IPCA dos atuais 9,56% (em 12 meses até julho) para algo próximo de 5,5%, mediana de projeções do boletim Focus, pode “melhorar a sensação” e dar um alivio às sucessivas quedas nos índices de confiança dos consumidores.

Fonte: Valor Econômico