Gastar mais do que o orçamento permite é um erro comum na vida financeira de muitos brasileiros, mas quando isso acontece com muita frequência, o problema pode ser mais sério do que se pensa. Um estudo do Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e daConfederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) mostra que quatro em cada dez (40%) internautas vivem fora do padrão de vida que seria adequado à sua realidade financeira.
O levantamento identificou o perfil da população que vive além dos padrões permitidos por sua renda, investigando os motivos e hábitos que levam esse comportamento a extrapolar o orçamento mensal. Cerca de 60% dos entrevistados que vivem fora do padrão de vida ideal para sua renda são mulheres; 49% são casados ou vivem em união estável; 33% têm entre 25 e 34 anos, e 46% pertencem à classe C – enquanto 16% pertencem à classe A.
Dentre os entrevistados que vivem fora de seu padrão de vida, mais da metade (54%) se considera insatisfeita com o padrão atual, embora 57% encare a situação como melhor do que há cinco anos. Quando analisam as perspectivas para o futuro, 84% acreditam que seus padrões aumentarão de nível em cinco anos. Segundo o presidente do SPC Brasil, Roque Pellizzaro Junior, esse otimismo é motivado pela disposição de investir em si mesmo: “A pesquisa mostra que 52% dos entrevistados garantem estarem se profissionalizando e trabalhando. No médio prazo, esperam colher os frutos com cargos melhores e boas perspectivas de crescimento no emprego”, diz o presidente.
Para elaboração do estudo foram considerados os internautas de todo o Brasil e pertencentes às classes A, B e C, com renda maior que dois salários mínimos. “A definição do conceito ‘fora do padrão de vida’ leva em conta dois critérios. O primeiro é ter fechado as contas do mês nos últimos seis meses sem sobra de dinheiro, ou não ter conseguido fechar as contas do mês, ficando no vermelho”, explica Pellizzaro. “No segundo critério, para aqueles que ficaram no vermelho, o motivo de não ter conseguido fechar as contas do mês excluiu fatores como perda de emprego, problemas de saúde ou falecimento na família.”
Para 92% está mais difícil melhorar o padrão de vida
Ainda que boa parte dos entrevistados acredite no próprio potencial para mudar a situação, o cenário econômico do Brasil não é favorável: 92% dos entrevistados acreditam que está mais difícil elevar o padrão de vida atualmente, principalmente por que tudo está mais caro.
Outros motivos citados para justificar essa dificuldade são a queda na renda (36%) – os entrevistados alegam que o salário não está acompanhando a inflação e o aumento dos preços; 28% citam os filhos e outras responsabilidades das quais não podem abrir mão no momento, e 23% mencionam a dificuldade para encontrar emprego estável (23%). “Boa parte das causas citadas pelos entrevistados podem ser atribuídas à crise econômica que estamos passando”, afirma a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti. “A inflação cada vez mais alta está aumentando os preços dos produtos. Até mesmo as contas básicas, como de água e luz, são afetadas.”
Apenas 9% conseguem poupar dinheiro no fim do mês
Viver acima do que o padrão de vida permite tem uma série de consequências quando se observam os detalhes do orçamento dos entrevistados: 40% afirmam que não tiveram sobra de dinheiro no mês de junho, e outros 32% afirmam que não sobrou nada e ainda ficaram devendo, e apenas 9% conseguiram poupar alguma quantia no mês de junho. Dois em cada dez entrevistados (26%) admitiram não alcançar seus objetivos porque nunca sobra dinheiro.
Porém, mesmo com a situação econômica em crise, 49% dos entrevistados garantem ter mantido o padrão de vida que possuem, ainda que tenham enfrentado dificuldades financeiras ou se endividado. Já 39% tiveram de reduzir gastos para evitar dívidas e manter as contas em dia, e apenas 11% garantem que não tiveram dificuldade para manter o mesmo padrão.
Compras imediatistas X investimentos
O estudo do SPC Brasil mostra que quem vive fora do padrão de vida já alcançou uma série de objetivos de consumo: 93% têm internet em casa, 86% possuem smartphone e 71% têm TV por assinatura. Já as metas ainda não realizadas dos entrevistados, envolvem investimentos financeiros maiores e incluem ter algum tipo de reserva financeira, como investimentos ou previdência privada (93%), adquirir a casa própria (91%), poder viajar todo ano (85%) e comprar um carro (81%).
Os principais gastos responsáveis por exceder os limites do orçamento dos entrevistados correspondem às compras de supermercado (59%). Também foram citados os gastos com almoços e/ou churrasco para receber amigos e parentes em casa (50%); as roupas e calçados (49%); e os bares e restaurantes (43%).
“A pesquisa mostra que os entrevistados até pretendem investir e ter reservas financeiras, mas essas opções – muito importantes, aliás – ficam atrás de desejos mais imediatistas, como comprar o celular da moda ou ter um pacote de TV por assinatura mais completo”, afirma o educador financeiro do SPC Brasil e do portal Meu Bolso Feliz, José Vignoli.
69% se sentem frustrados com o padrão atual
A pesquisa também investigou se os entrevistados consideram ter uma vida realizada e feliz a partir de seu padrão de vida. Para atingir esse objetivo, 62% afirmam ser essencial ter tempo para passar com a família e os amigos, enquanto 41% mencionam ter dinheiro para comprar uma casa confortável, ao lado do tempo para se cuidar, praticar esportes, ir ao salão de beleza, etc. (37%).
Porém, esses aspectos materiais e sociais identificados como essenciais para manter um padrão de vida confortável e feliz têm um preço: 34% estão sempre ansiosos com as contas a pagar, 23% estão sempre irritados com as dívidas e 20% disseram estar com estresse constante e pressão no trabalho. Outros 19% afirmam que não têm mais tempo de cuidar de si mesmo. Todos esses fatores fazem com 69% dos entrevistados se sintam frustrados ou revoltados com a situação em que vivem.
Cerca de 66% dos entrevistados se dizem felizes, com nota média de 7,0 para sua felicidade, numa escala de 1 a 10. Por outro lado, quando são questionados especificamente sobre sua realidade financeira, a nota média de felicidade cai para 5,2, e o percentual dos que se dizem felizes diminui para 30%.
“Percebe-se que o aspecto de felicidade passa por aspectos materiais e sociais”, analisa Vignoli. “Isso faz sentido, uma vez que obter um bem de consumo pode trazer felicidade momentânea para alguns. Porém, não podemos esquecer que viver fora dos padrões adequados à renda e comprar sem planejamento pode trazer consequências negativas e indesejadas, como um endividamento sem controle e uma baixa reserva financeira, tão necessária para imprevistos e a aposentadoria.”
Fonte: CNDL