De acordo com o ex-ministro da Fazenda, Delfim Netto, o objetivo de deixar o real “supervalorizado”, nos últimos dez anos, fez com que a indústria perdesse US$ 320 bilhões em demanda, o que trouxe consequências para o baixo crescimento econômico, percebido atualmente.
“[Entre 2002 e 2012], o governo insistiu que taxa de juros [Selic] controla a inflação, que controla o câmbio. Isso destruiu o processo industrial no Brasil. Primeiro, a demanda externa foi roubada, depois foi a vez da demanda do mercado interno [dólar mais barato incentiva as importações e reduz a produção interna]”, disse Delfim Netto, durante o Fórum Brasil: Diálogos para o Futuro, realizado ontem pela revista Carta Capital, em parceria com o Instituto Envolverde.
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), pré-candidato às eleições presidenciais deste ano, afirmou, também no evento, que essa situação apontada por Delfim Netto fez com que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro “se distanciasse dos países emergentes”. “Se queremos ser a sexta economia no mundo, precisa valorizar mais a indústria. O setor com relação ao PIB chegou ao que era antes do governo de Juscelino Kubitschek”, avaliou, ao mostrar que a indústria representa atualmente quase 14% do PIB, enquanto no governo conhecido como JK, era por volta de 13%. O auge da contribuição dessa área para a economia foi de 27% em 1985.
O ex-ministro da Fazenda, disse ainda que o governo brasileiro precisa entender que não poderá mais contar com a ajuda do mercado internacional para sustentar o crescimento econômico nos próximos anos. “O Brasil precisa pensar diferente, o mundo não vai poder mais ajudar [com investimentos]. Não adianta pensar que sempre será a bola da vez. Se pensar assim, deixa de ser muito em breve”, alertou Delfim Netto. “Não podemos confiar no progresso do mundo [recuperação das economias avançadas] e que isso vai levar o País ao progresso como foi entre 2003 e 2010 [sendo que no último o PIB brasileiro subiu 7,5%]”, analisou.
Na opinião do economista norte-americano e ganhador do Prêmio Nobel de Economia em 2008, Paul Kurgman, o maior risco que o Brasil tem neste momento é com a desaceleração do PIB chinês. “Como o Brasil é economia exportadora de commodities, o País sofrerá um choque por causa da crise da China. Não estamos falando de catástrofe [no Brasil], é algo que pode ser controlado, mas não seria bom para vocês”, disse Krugman, que também participou do fórum.
Sem crise
Kurgman e Delfim Netto concordam que, apesar dos riscos”, não há nenhuma “tragédia” – palavra usada pelos dois especialistas – no Brasil. “O Brasil já não é mais vulnerável. Em 1999, quando houve uma queda no real, houve expectativa que a crise financeira se disseminaria, mas não aconteceu. Houve inflação, que subiu muito, mas há nenhuma catástrofe. A inflação está controlada e a política fiscal está mais responsável”, avalia. “O Brasil está se saindo melhor do que poderia imaginar”, resumiu Krugman.
Delfim Netto comentou também que o País “não está perto de um apocalipse”. Ele lembrou que a dívida bruta representa 60% do PIB “já há dez anos” e que o déficit fiscal está perto de 3,5%, nesta mesma relação. “O problema é que as pessoas não se conformam que não estamos a caminho de um futuro muito maior do que idealizaram. É claro que a inflação não está em patamar agradável, mas não há uma iminência de descontrole”, entende.
Por outro lado, o ex-ministro da Fazenda afirmou que a contabilidade criativa realizada em 2012 para atingir a meta do superávit primário do setor público consolidado – economia para o pagamento dos juros da dívida pública – “foi demais”, até para ele, que apoiava o governo.
Naquele ano, o governo lançou mão de medidas previstas em lei – desconto das despesas com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) -, assim como antecipou o recebimento de dividendos de empresas estatais e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e pegou dos recursos do Fundo Soberano do Brasil (FSB) – que são utilizados em situação de emergência em cenário de crise – para cumprir a meta em torno de 3% do PIB.
Para Delfim Netto, de qualquer forma, para aumentar o ritmo da economia brasileira – que está abaixo do potencial – é preciso que o setor privado e o governo trabalhem juntos para alavancar os investimentos. “O crescimento depende hoje da melhora da produtividade do trabalho. E quem vai fazer isso é o setor privado, não o governo”, concluiu.
Fonte: DCI Online