Para jovens, celular é mais básico que roupa

1 de setembro de 2014

Adolescentes nos EUA preferem um bom sinal de Wi-Fi a uma grife do momento

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Divulgação

Para alguns adolescentes, usar os jeans da temporada anterior será sempre algo impensável. Mas um número crescente deles considera que escrever mensagens de texto num smartphone antiquado é ainda pior.

Para o varejo de roupas, esse adolescente obcecado por tecnologia representa uma grande ameaça na ainda importante temporada de vendas de volta às aulas.

Camisetas sem manga e jeans estrategicamente rasgados já não proporcionam um atrativo garantido para cadeias de varejo norte-americanas como Hollister e American Eagle Outfitters. O diferencial social hoje em dia envolve usar a mais recente tecnologia em aparelhos portáteis.

“Roupas não são importantes para mim”, disse Olivia D’Amico, uma jovem de 16 anos de Nova York, quando fazia compras na Hollister com sua irmã e uma amiga. “Metade do tempo não compro realmente nenhuma marca. Comprei apenas um par de Doc Martens falsos porque não me importo mesmo.” Ela provavelmente gasta mais em tecnologia porque gosta de “ficar conectada”, como disse.

“É mais empolgante para muitos adolescentes comprar um novo smartphone que pode fazer um monte de coisas legais, do que novas roupas”, disse Nicole Myers, 19 anos, modelo em Nova York que saiu de uma loja Apple na segunda-feira com um iPhone que custou cerca de US$ 200. “Um telefone entretém muito mais. É uma distração melhor do que roupas.”

Analistas e identificadores de tendências concordam que está em curso uma grande virada nas tendências e gastos de adolescentes. John Morris, um analista do setor de varejo na BMO Capital Markets, diz que suas pesquisas com adolescentes sobre tendências com frequência se afastam do tema vestuário.

“Você tenta falar sobre qual será o novo visual, o que empolga na compra de roupas, e a conversa acaba sempre voltando ao iPhone 6”, disse ele. O setor de varejo de roupas para adolescentes, cujas vendas representam cerca de 15% de todas as vendas de roupas, segundo o NPD Group, vive uma crise profunda porque as vendas caíram nos últimos trimestres.

Afora a atenção dada a itens tecnológicos, como telefones, aplicativos e acessórios, alguns varejistas de longa data foram duramente atingidos pela competição de lojas de “fast-fashion” (moda rápida) como Forever 21 e H&M, que oferecem tendências de última hora a preços baixos. As compras online também reduziram o tráfego de consumidores adolescentes em shoppings, e a popularidade do Instagram espalha modismos tão rapidamente que os jovens não ficam atrás de algum item de moda duradouro.

Moda tecnológica. Os consumidores jovens são os primeiros a assinalar o uso de telefones no comércio eletrônico. “Você pode fazer compras online pelo seu telefone”, disse Catlin Haywwod, 15 anos, uma estudante de segundo grau de Nova York que estava entrando numa Hollister no centro de Manhattan. Fã do “estilo Califórnia” da loja, ela também notou que a loja possuía muitas capas de telefone decorativas e isso lhe permitiría usar os acessórios no seu telefone.

Isto em si é uma declaração de moda, ela sugeriu. “Quando você tira fotos, as pessoas veem sua capa”, disse.

Aliás, acessórios como capas de telefones cravejadas de cristais ou fones de ouvido em cores de néon estão entre as prioridades de compra dos jovens.

“Ter um telefone descolado para mostrar como você está conectada é uma parte enorme do estilo de uma pessoa e da vida hoje em dia”, disse Eva Chen, editora-chefe da Lucky Magazine, acrescentando que os adolescentes usavam smartphones para sinalizar status como homens costumavam fazer com relógios ornamentados.

Stephanie Wissink, uma diretora gerente da Piper Jafffay, disse que após muitos anos de forte crescimento, a porcentagem de dinheiro que adolescentes gastavam em eletrônicos parece ter se estabilizado em torno de 8% ou 9%. A penetração do celular é alta e os jovens em geral precisam esperar pelo próximo upgrade para seu próximo aparelho, disse ela.

Mas a tecnologia parece influenciar indiretamente outros hábitos de gastos, comentou. Pela primeira vez, a pesquisa semianual da Piper Jaffray com adolescentes na primavera americana revelou que eles gastaram mais dinheiro em comida superando por pouco os gastos com roupas – do que em qualquer outra categoria.

“Revelou-se uma atração por ambientes de restaurantes”, disse Wissink. “Aí nós perguntamos a adolescentes sobre a razão disso, e a resposta foi o WiFi gratuito.” “Sou viciada em Instagram”, disse Ann Borrero, uma jovem de 19 anos que frequenta o ensino secundário no Brooklyn e tem uma lista atualizada de restaurantes que ela com frequência escolhe para ter acesso à internet.

Pressão

Executivos de cadeias tradicionais de varejo sentiram a tensão de resultados desapontadores, e muitas dessas companhias sofreram mudanças em seus escalões superiores.

Este mês, o diretor presidente da Aéropostale, Thomas P. Johnson, aceitou sair e ser sucedido por seu antecessor, Julian R. Geiger. Em janeiro, o diretor presidente da American Eagle, Robert L. Hanson, deixou a companhia depois de meros dois anos no cargo. No mesmo mês, a Abercrombie & Fitch separou os cargos de presidente executivo e do conselho sob pressão de investidores.

Além das mudanças no panorama específico dos adolescentes, os varejistas de várias categorias estão aprendendo como lidar com uma temporada de volta às aulas que mudou significativamente nos últimos anos. Apesar de ainda ser uma temporada crucial para o varejo, sua janela se tornou menos delineada, às vezes começando um pouco mais tarde e com frequência durando até depois do começo do ano letivo.

“No passado, comíamos três refeições completas por dia, e agora o que está na moda é comer coisinhas”, disse Chen. “Acredito que está havendo algo parecido com as compras.”

Fonte: O Estado de S. Paulo (texto original do THE NEW YORK TIMES –  tradução de Celso Paciornik)