“Quem não lê, mal ouve, mal fala e mal ver”
(Provérbio popular)
Logo após o Carnaval, retomando as atividades acadêmicas de Professor e Coordenador de Curso, recebi de uma querida colega – a Prof.ª Bartira Bastos – um texto do Rubem Alves publicado em 2011 no jornal Correio Popular, de Campinas, no qual o mesmo escreve sobre “Ler e prazer”.
O Rubem Alves não escreve… Ele dialoga com o leitor… O texto flui com grande leveza, que parece realmente um bom bate papo.
No texto, Ele conta um passeio que fez à Cabo Frio-RJ, convidado por um amigo. Ocorre, que neste passeio eles tiveram a companhia de cinco adolescentes. Diante das suas companhias, o autor faz uma reflexão sobre o fato de se dizerem que “os adolescentes não gostam da leitura”.
Achei o pequeno texto fantástico e super didático, principalmente no que tange a servir de ponto de partida reflexivo ao fomento do hábito da leitura.
Adorei o texto. Porém, no cotidiano, constato que não são apenas os adolescentes que não são afetos à leitura. Pior que isso… As pessoas em geral não são habituadas a ler. Isso mesmo, o nosso povo não tem o hábito da leitura.
Mas onde está o problema?
Seria culpa da infinita audiência da (péssima programação da) Televisão? Ou quem sabe a culpa seria da internet e da infinidade de fontes de entretenimentos digitais e virtuais com que passamos a conviver? Seria, porventura, culpa das variadas opções de lazer do mundo moderno, que passeiam por eventos esportivos, festas populares, baladas e demais opções da vida social?
Bem, não nos propomos a identificar quem seria o verdadeiro vilão da história, pois num país com altas taxas de analfabetismo, com baixa qualidade da educação, teríamos tantos vilões que não seria uma tarefa fácil encontrarmos apenas um culpado, pois estaríamos criando apenas um “bode espiatório” para levar a culpa por um processo inteiro comprometido.
Entretanto, o texto me fez refletir que o problema da ausência do hábito da leitura está em dois aspectos: 1º) na falta de costume (hábito); e o 2º) na má escolha da leitura.
O problema inicial parte da idéia de que somos reflexos do nosso “gosto do costume”. Isso mesmo, o nosso gosto, as nossas escolhas são resultados dos nossos hábitos, do que nós fomos acostumamos a fazer. Este costume, a propósito, tem como ponto de partida o ambiente doméstico e familiar. São nossos pais e familiares com quem convivemos desde a terna infância os responsáveis pela nossa educação, pelos nossos valores, enfim, pelo desenho da nossa personalidade[2].
O segundo responsável por este gosto de costume são os nossos professores e o nosso ambiente social. Os professores têm o mérito de nos retirar da escuridão do analfabetismo, nos ensinando a ler e a escrever. Mas, não pode parar por aí. Os bons professores devem incentivar a leitura, ajudar a construir o hábito de ler, como algo do cotidiano, importante e vital.
Leituras chatas, cansativas, densas demais não fazem ninguém gostar de ler. Ao contrário, afasta o leitor e obsta o surgimento de vários novos leitores.
No texto, o Rubem Alves delineia em seu texto um singelo embate ideológico sobre o objetivo da leitura. Para o professor da sua filha, a finalidade da leitura seria a de “produzir a consciência crítica”. Ele, por sua vez, reflete sobre a idéia de que a leitura nos serve para dar prazer.
Ambos os aspectos são relevantes, mas acredito que há entre ambos um equívoco não no posicionamento sobre o objetivo da leitura, mas, sim, no ponto de vista adotado para desenhar a finalidade da leitura. Senão, vejamos:
Entendemos que a leitura, por si só, não é para produzir consciência crítica, mas, sim para dar prazer, ou para agregar conhecimento. De qualquer maneira, a leitura deve ser vista como uma forma de entretenimento que alimenta a nossa criatividade, que nos leva ao infinito, dando asas à nossa imaginação. O que cria consciência crítica, por sua vez, não é a simples leitura, mas, sim, as nossas reflexões posteriores à leitura.
A leitura sem a reflexão posterior se restringe apenas a uma forma de entretenimento. Portanto, precisa ser prazerosa.
Acredito que a sala de aula pode ser um espaço para fomentarmos a leitura e viabilizarmos o debate sobre o seu objeto. Assim, estaremos fomentando a magia da leitura e permitindo que a consciência crítica aflore diante dos debates calorosos de sala de aula.
A única exigência é que, busquemos leituras agradáveis, onde o conteúdo seja abordado de modo a agregar o conhecimento, mas que não seja um castigo, com textos chatos e densos sem razão de ser, talvez, assim, possamos realmente mudar o mundo, dando asas à imaginação.
Sabe quando um casal vai ao cinema, assistem juntos ao filme (assistem mesmo, não ficam só namorando), depois decidem ir ao restaurante. Chegando lá no restaurante o cara pergunta: “E aí, gostou do filme?” Este é o divisor de águas…
Os casais mais vazios terminam a conversa rapidamente, com as respostas frias e diretas: “gostei” – e ponto final. E daí passam a conversar sobre o que gostaria de beber e comer, até que, ao final do jantar (sem qualquer outro assunto relevante) já estão preparados para irem ao Motel terminar a noite com chaves de ouro.
Ocorre, que, assim, o filme passa em branco… Transforma-se num entretenimento vazio, que não enriquece em nada quem foi simplesmente espectador… É como a TV assistida sem reflexões[3]…
Com o livro acontece a mesma coisa. A leitura pura e simples é um entretenimento criativo, que nos serve ao prazer, à satisfação. A consciência crítica só pode surgir após as reflexões individuais, ou decorrentes de diálogos, ou debates com outras pessoas sobre o tema objeto da leitura.
Infelizmente, nós somos egoístas por natureza e não temos o hábito de compartilhar o conteúdo adquirido, pois perdemos o hábito do diálogo…
Claro que a leitura não serve apenas ao deleite intelectual. Por exemplo, nas escolas, num curso, ou numa Faculdade, a leitura tem como objetivo principal a transmissão do conhecimento para o processo de formação profissional, sendo essencial ao aprendizado e à capacitação. Mas não se faz o bastante se não houver a decodificação do conteúdo nas aulas e o debate sobre o tema estudado.
Assim, o mais importante é criarmos o hábito da leitura, buscarmos o conhecimento, mas nos permitirmos o direito de questionar o conhecimento adquirido, de modo a refletirmos as idéias, confrontando-as com a realidade, para que o conhecimento adquirido não se submeta a uma realidade teórica inexistente e inaplicável. Só assim poremos transcender ao plano das ideias e percebermos que com a LEITURA poderemos mudar o MUNDO.
[1]Clever Jatobáé Advogado e Consultor Jurídico baiano, Pós Graduado em Direito do Estado pelo JusPodivm, Mestrando em Família na Sociedade Contemporânea pela UCSal, Aluno do Doutorado em Direito Civil pela UBA – Universidade de Buenos Aires – (Argentina). Professor e coordenador do Curso de Direito da Faculdade Apoio Unifass (Lauro de Freitas-Ba), bem como Professor de Direito da Faculdade Ruy Barbosa, onde também Advoga e Coordena o Balcão de Justiça e Cidadania da Boca do Rio. (E-mail: cleverjatoba@yahoo.com.br)
[2] Posso dizer que criei o hábito da leitura graças ao meu pai, que sempre fomentou a leitura por meio das revistinhas em quadrinhos.
[3] A Televisão é hoje um dos maiores formadores de opinião. Somos bombardeados por informações que no cotidiano não nos permite dialogar, rebater, ou questionar, pois a televisão com cada notícia, matéria, informação, programa, nos apresenta “verdades absolutas” sem que tenhamos espaço para questionar, pois há um monólogo na comunicação e como (tele) espectadores não temos tempo para refletir ou questionar as informações, assim, elas terminam calando fundo em nosso inconsciente e nos impondo opiniões, que não são nossas, mas que acreditamos ser.
Fonte: JusBrasil