Busca por serviços de conserto cresce 40% por conta da crise

25 de agosto de 2015

Tem muita gente ressuscitando aquele equipamento que estava perdido no canto

eletroportáteisAo invés de partir para a loja mais próxima e dividir o pagamento em até 10 vezes no cartão de crédito, o aperto financeiro tem feito o consumidor não apenas ajustar as contas, mas também optar pelo conserto de equipamentos usados. É o que aponta um levantamento feito pelo CORREIO, que visitou cinco assistências técnicas de Salvador que atendem a grandes marcas de eletros, celulares e informática. Todos os estabelecimentos foram unânimes em afirmar que, nos últimos meses, a demanda por serviços aumentou em média 40%.

Tem muita gente ressuscitando aquele equipamento que estava perdido no canto do depósito ou tentando dar mais uma chance ao que falhou recentemente. Cautela no consumo confirmada nos últimos dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que registram uma queda de 2,2% do comércio varejista nos meses de janeiro a junho, se comparado ao mesmo período do ano passado.

Na tentativa de economizar ainda mais, mesmo quando muitos duvidam, o produtor cultural Gilson Vieira, acreditou que os dois celulares, a máquina de lavar e o notebook  ainda tinhan salvação. ”É melhor consertar do que se endividar para comprar o novo”.

Ao invés de gastar cerca de R$ 3 mil com a troca, pagou pelo conserto dos quatro itens um pouco mais que R$ 100. “Quando as pessoas percebem que precisam ter outra postura para segurar as contas, a crise acaba servindo como motivação para que a gente seja mais econômico e utilize aquilo que temos ao máximo”, assegura.

Na oficina, 800 equipamentos entre celulares, computadores, itens de linha branca e marrom estão passando por reparos. O aumento do movimento garantiu a contratação de quatro novos funcionários e há previsão ão para admitir a mesma quantidade até o final de setembro. “O nosso ganho aumentou em 40%. Consertar tem sido a primeira opção dos clientes”.

Ainda serve
Segundo o gerente da Digital Service, assistência autorizada da marca LG, Marcos César, há quatro meses, a loja recebia por dia 80 aparelhos de celular para conserto. Hoje, esse número mais que dobrou. A assistência chega a receber 180 aparelhos diariamente. “Foi um aumento inesperado que chegou a surpreender a gente”, considera.

Produtos que já passaram da garantia também têm contribuído para o crescimento da demanda por esses serviços. Na mesma loja, os equipamentos fora da garantia respondem por 30% do faturamento. “O que a gente percebe é que no caso de um televisor, por exemplo, após o defeito imediato, o cliente traz o equipamento e, além disso, aproveita para fazer reparos em outros que estavam aposentados em casa”, diz o gerente.

Na assistência técnica para produtos da marca Samsung, a oficina já chegou a receber 200 celulares em um mesmo dia. “A maioria dos aparelhos que chegam está ainda na garantia e muitas vezes precisa apenas de reparo na configuração ou no sistema operacional, que apresentou alguma falha”, avalia a coordenadora de atendimento da loja, Fabiana Santos.

O reaproveitamento foi a solução que o assistente administrativo Marcel Oliveira viu para resolver a falta de uma  geladeira. Ele até comprou, mas no lugar de uma nova, optou por uma de segunda mão, que saiu por R$ 300. Somou mais R$ 200, consertou o que precisava e ainda deu um trato com pintura. “Ficou zerada. Como tinha pouca grana foi o jeito. Com a crise que está aí, se eu puder reformar alguma coisa e não usar o cartão está ótimo”.

Com a economia, Oliveira consertou também o ventilador de teto que por pouco não foi para o lixo. “Eu estava pensando em jogar ele fora mesmo, mas um eletricista que veio fazer um serviço aqui em casa me deu um toque. Troquei uma peça que custou R$ 26 e o ventilador está parecendo um helicóptero de tão bom”, comemora.

Reparo
A proprietária da Televídeo e Som, Maria José Coelho confirma também o aumento na procura pelo conserto. A assistência tem feito muito serviço também de garantia estendida. “Antes de terminar a garantia, o novo já deu defeito. Como o consumidor não paga nada por este serviço, não deixa de ser mais uma forma de economizar. Aí o novo fica de lado mesmo”.
Reduzir o valor do preço pago pelo serviço é um diferencial competitivo para manter o bom momento do setor, como ressalta o recepcionista da Vosmel Assistência Técnica, Adriano Silva.

“Ao menor sinal de dificuldade que a assistência coloca, a gente corre o risco de perder o cliente para a loja que divide em um monte de vezes no cartão”, revela.
Por um preço mais baixo, o cliente aceita até esperar mais um pouco. “A gente diminui o valor do serviço para evitar que ele decida comprar um novo. Mesmo que aquela peça demore um pouco para chegar ele aceita a contrapartida”.

Compra adiada
O consumidor tem dado um “jeitinho” até na substituição de assessórios, como aponta o chefe da oficina da NR Eletrônica, Adelício Rocha. “No caso de produtos da Wallita, tem cliente  trocando até a lâmina do barbeador elétrico. Sem dúvida, o reparo de itens que seriam facilmente descartados é bem maior [agora]”.

Quem adiou a compra de um aparelho novo foi a dona de casa  Michele Pereira, que já levou três vezes o tablet do filho para consertar. “A minha esperança é que ele ainda tenha jeito. Ele faz uma zuadinha, mas só engana a criança e desliga”. Para ela, o problema maior é que o filho gosta do tablet. “É um apego danado, aí a gente faz um esforço para resolver isso sem gastar muito”, conta.

Em outros tempos, a consultora de vendas Lindaura Novais trocaria o liquidificador que acabou de pifar por um novo, mas resolveu também jogar este gasto lá para frente e rezar para que ele não pare de vez. “Se eu não estivesse na situação que estou agora ia logo comprar outro. Mas tenho que economizar porque dinheiro que é bom está difícil”.

O próximo que vai para o conserto é o ferro de passar. No orçamento que fez o reparo não vai passar de R$ 10. “Se eu fosse comprar um, ia gastar R$ 70.  Antes eu olhava a qualidade, mas agora vou naquilo que posso gastar menos né?”.

Consumidor deve ter atenção ao levar  produto
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor (CDC), caso logo após a compra o produto tenha apresentado um defeito, o consumidor tem até   30 dias para reclamar,  se ele não for durável, ou 90 dias se for um bem durável.

Sua vigência começa a partir da data de emissão da nota fiscal, com o prazo e condições impostas pela empresa – normalmente estabelecida no Termo de Garantia. “O consumidor tem que perceber bem qual o tipo de produto que ele está levando para assistência técnica e exigir um orçamento com o valor do custo previsto”, ressalta a diretora institucional da Proteste Associação de Consumidores, Maria Inês Dolci.

Ainda segundo o CDC, o fornecedor e o fabricante têm 30 dias, a partir da reclamação, para sanar o problema do produto. Extrapolado esse prazo, o consumidor pode exigir um produto similar, a restituição imediata da quantia paga ou o abatimento proporcional do preço. Maria Inês lembra ainda que é preciso exigir o comprovante de pagamento e um diagnóstico do problema corrigido assim que receber o equipamento de volta. “Dê preferência a assistências conhecidas ou recomendadas por quem já utilizou o serviço e guarde todos os documentos”.

Entre as principais reclamações recebidas pelo Procon-BA está a qualidade dos serviços prestados pelas assistências técnicas, como assegura o assessor técnico do órgão, Filipe Vieira. “O fornecimento parcial do serviço ou a má prestação do serviço são as principais queixas. Os consumidores apontam que  a assistência conserta alguns defeitos, mas não resolve todos os problemas”, afirma.

É necessário também que o consumidor esteja atento à utilização de componentes ou peças originais de fábrica na substituição das peças. “Por isso é tão importante que o consumidor procure uma assistência técnica credenciada pelo fabricante daquele produto”, enfatiza.

Cobertura  estendida não aumenta o prazo de garantia do fabricante
Ao contrário do que muitos podem pensar, a garantia estendida não é um tempo maior de cobertura, caso o produto ultrapasse o prazo de garantia convencional. Na verdade, ela é uma espécie de seguro, como explica o advogado especialista em Direito do Consumidor Alexandre Dórea: “Não há nenhuma relação com o fabricante. A garantia estendida consiste em um seguro, que irá obrigar a seguradora  a trocar o aparelho ou consertá-lo”.

O consumidor deve ficar atento para os termos da garantia e ao início da sua vigência, pois ele só estará coberto nos itens que estão descritos na apólice. Geralmente, os contratos protegem o produto conta defeitos, sejam  eles elétricos, eletrônicos ou mecânicos.  Ou seja, no caso de um celular, por exemplo, o produto pode ter cobertura apenas do aparelho e não da bateria.

O Código de Defesa do Consumidor já proporciona uma garantia de 30 dias para bens não-duráveis e de 3 meses para bens duráveis. Regulamentada pela SUSEP (Superintendência de Seguros Privados), a garantia estendida seria apenas um contrato opcional, onde, caso ocorra um sinistro, a seguradora tem prazo de 30 dias para cumprir o que ficou firmado em contrato, seja com o reparo do bem, troca  ou pagamento em dinheiro.

Fonte: Correio* 24 horas