Um garoto do ensino médio sente-se entediado e começa a trocar recados na biblioteca com alguém que o admira anonimamente. Os dias passam, o jovem parece cada vez mais envolvido e intrigado. O período de férias está prestes a começar e ele finalmente descobre com quem estava se correspondendo. Enquanto tudo isso acontece, uma tragédia é arquitetada sem que ninguém perceba. Até a trilha que embala o enredo, que parece falar muito sobre o romance, na verdade, tem uma mensagem muito mais forte. A breve sinopse descreve uma forte campanha publicitária lançada pela ONG Sandy Hook Promise nos Estados Unidos, com o objetivo de evitar tragédias em escolas.
O ponto central do vídeo é alertar para os sinais que passam despercebidos por todos nós – e que a atenção ao que acontece ao nosso redor pode prevenir grandes tragédias. As limitações da nossa atenção nos deixam vulneráveis a determinadas armadilhas a todo momento. Os detalhes que escapam de um contrato quando você está com o foco em outra situação, a ação de marketing com um discurso estratégico que te leva a enxergar vantagem em promoções que, na verdade, não existem. Resultados de empresas podem ser ruins e oportunidades de negócios perdidas por falta de foco em detalhes importantes. Há ainda as clássicas situações em que a pessoa se empolga tanto e coloca tamanho foco em uma ideia mirabolante para montar uma empresa inovadora, que perde dinheiro por não ter dado a devida atenção ao plano de negócios e à viabilidade do projeto.
Depois de assistir a campanha, você provavelmente deve ter se questionado: “Como não notei algo tão óbvio acontecendo exatamente ao mesmo tempo?”. O psicólogo Christopher Chabris, um dos criadores da famosa experiência do Gorila Invisível, resume em palestra sobre o que chama de “Ilusão de Atenção”: temos a crença de que a nossa visão de realidade é muito mais ampla do que aquilo que realmente conseguimos enxergar.
E o mais interessante é que não ficamos imunes às armadilhas da atenção. No formato original da experiência do Gorila Invisível, as pessoas recebem a tarefa de focar a atenção em quantos passes de bola faz uma equipe de basquete – e deixam de perceber que uma pessoa fantasiada de gorila passa entre os jogadores. Mesmo depois de conhecer o teste, uma variação da experiência ainda pega as pessoas desprevenidas: há uma versão em que as cores do cenário mudam e uma jogadora abandona a cena sem que ninguém note. No caso da campanha publicitária citada acima, a pegadinha também é dupla. Além das pessoas não perceberem as atitudes do atirador em segundo plano, pouca gente nota que a trilha sonora da campanha tem mais a ver com a história do atirador do que com o jovem apaixonado.
O psicólogo Daniel Simons, que também desenvolveu a experiência do Gorila Invisível, levanta uma discussão interessante sobre isso em palestra sobre atenção. Nas palavras dele, o que experimentamos do mundo, na verdade, é uma ilusão. O que vemos é aquilo que o cérebro nos dá, é uma realidade alternativa. Nesse sentido, é preciso entender que as mesmas pessoas podem olhar para um determinado cenário e o enxergarem por perspectivas completamente diferentes. Por exemplo, um mês com resultados ruins para uma empresa. O gestor pode atribuir o problema à falta de produtividade da equipe, enquanto o time, em contrapartida, atribui o problema à falta de direcionamento do gestor.
Procurar entender perspectivas alheias às suas pode ampliar a sua capacidade de fazer bons negócios, de ter maior integração com sua equipe e, por fim, gerar melhores resultados. Assim como uma visão mais ampla é fundamental para que você não queime seus recursos com um empreendimento furado e para não cair em armadilhas do marketing.
Pense bem sobre tudo isso e pergunte a si mesmo: quantos gorilas estão passando por você sem serem notados?
Fonte: G1