20% dos brasileiros utilizaram cheque especial no último ano. Maioria não fez pedido de forma espontânea e 25% usaram dinheiro para pagar contas ou lidar com imprevistos. Maioria dos empréstimos pessoais ainda é feito em bancos tradicionais e 52% consideram juros abusivos
O cheque especial é uma das modalidades de crédito mais caras do mercado, mas nem por isso o consumidor brasileiro tem evitado usar esse limite disponível na conta, que muitas vezes é fácil de ser obtido. Uma pesquisa feita em todas as capitais pela Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL) e pelo Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) revela que, em cada dez brasileiros, dois (20%) recorreram ao cheque especial em algum momento nos 12 meses anteriores ao levantamento, percentual próxima aos 17% observados na mesma pesquisa do ano passado.
O levantamento ainda mostra que a maior parte (40%) dos usuários do cheque especial tem o hábito de utilizar o saldo extra todos os meses. Esse comportamento é ainda mais comum levando em conta as pessoas da classe C, D e E (48%). Outros 30% de usuários recorreram ao cheque especial a cada dois ou três meses e 27% pelo menos três vezes no ano.
O cheque especial é uma linha de crédito pré-aprovada, oferecida pelos bancos e, geralmente, utilizada de forma automática pelo cliente quando não há saldo suficiente para cobrir os débitos em sua conta bancária. Em média, os juros cobrados são de 320% ao ano, superiores inclusive ao cartão de crédito rotativo, segundo dados oficiais do Banco Central.
Para o educador financeiro do SPC Brasil, José Vignoli, por causa dos juros elevados, o cheque especial só deve ser utilizado em ocasiões emergenciais e durante períodos curtos. “É um erro incorporar o limite do cheque especial como parte da renda. Essa ilusão pode levar o consumidor a gastar mais do que o orçamento permite e ver sua dívida se transformar em uma bola de neve muito difícil de ser paga”, alerta Vignoli.
68% dos usuários de cheque especial não solicitaram crédito ao banco; 25% usaram limite para pagar contas ou lidar com imprevistos
De acordo com a pesquisa, apenas 24% das pessoas que usaram o cheque especial no último ano solicitaram o crédito de forma espontânea. A maior parte (68%) disse ter recebido o limite de forma automática ou a partir de uma oferta, sem a solicitação direta ao banco ou instituição financeira. Outra constatação é que somente três (33%) em cada dez usuários do cheque especial buscaram outras alternativas de crédito para conseguir o dinheiro que precisava antes de recorrer ao limite fornecido pelo banco.
A pesquisa revela que entre as motivações para recorrer a esse saldo extra, há um misto de falta de controle das finanças e eventos inesperados. Os imprevistos com doenças ou compra de medicamentos (25%) e o descontrole no pagamento das contas (25%) foram as principais razões do uso do limite do cheque especial. Há ainda pessoas que apelaram a esse dinheiro porque estavam com pagamentos de contas a vencer (23%) ou porque foram surpreendidas com a necessidade de manutenção do automóvel ou moto (18%).
Outro dado que inspira preocupação é que 38% dos entrevistados não analisaram as tarifas e juros envolvidos, principalmente, porque precisavam do valor, independentemente dos custos (25%), não perceberam que entraram no cheque especial (7%) ou por falta de interesse (6%). Parte significativa (43%) desconhece o valor dos juros e taxas que os bancos cobram no cheque especial e mais de um terço (34%) ficou com o ‘nome sujo’ por não honrar com o pagamento.
Para Vignoli, o mau uso do cheque especial pode iludir o consumidor, que acaba pagando caro pela facilidade, praticidade e disponibilidade do recurso. “O consumidor tem de ter clareza de que o dinheiro incorporado ao seu saldo bancário não é seu. Se usar, terá de devolver, e pagando juros altíssimos, afinal, se trata de um tipo de empréstimo. Muitas vezes, as pessoas acabam sendo impulsivas ou ingênuas em aceitarem uma oferta sem analisar suas condições de pagamento”, alerta o educador do SPC Brasil.
21% dos que têm empréstimos em bancos ou financeiras usam dinheiro para despesas básicas; entrevistados têm, em média, 17 parcelas a pagar
Outra modalidade também investigada pela pesquisa foram os empréstimos feitos em bancos ou demais instituições financeiras. A constatação é que a maior parte dessas pessoas pega dinheiro emprestado para cobrir desarranjos orçamentários. Em 21% dos casos, o dinheiro serviu para honrar compromissos com despesas básicas, como água, luz, telefone, condomínio e estudos, por exemplo. O mesmo percentual de 21% foi para quitação de outras dívidas, como empréstimos, cartão de crédito e prestações de compras. Em seguida aparecem a reforma da residência (16%), viagens (16%) e pagamento de exames, remédios ou consultas médicas (12%).
De modo geral, 18% dos consumidores brasileiros contraíram algum empréstimo pessoal em banco ou financeira nos 12 meses anteriores à pesquisa e 14% fizeram uso do crédito consignado, modalidade em que as parcelas são descontadas diretamente do salário ou da aposentadoria. Em média, os entrevistados possuem dois empréstimos e estão com 17 parcelas a pagar.
Assim como no caso do cheque especial, o uso do empréstimo deve ser feito com cautela, afirma Vignoli. “Contratar um empréstimo pode ser a decisão certa quando o consumidor tem planos de longo prazo e está preparado para assumir um compromisso financeiro por vários meses sem desequilibrar o orçamento. Mas em muitos casos, antes de buscar um empréstimo, o mais adequado é tentar uma renda extra ou diminuir ao máximo as despesas mensais, cortando gastos supérfluo”, explica.
Bancos tradicionais respondem por 60% dos empréstimos; 19% não analisaram juros e 52% consideram taxas abusivas
No caso dos empréstimos, as instituições financeiras convencionais ainda representam a maior parte dos credores, embora as fintechs e os bancos digitais já ocupem um espaço relevante. Em cada dez entrevistados que utilizaram alguma modalidade de empréstimo no último ano, seis (60%) recorreram aos bancos tradicionais. Já 17% optaram pelo cartão de crédito, 13% buscaram financeiras, 11% os bancos digitais e 8% as fintechs de crédito.
A pesquisa mostra que um quarto (25%) dos entrevistados não tomou a iniciativa de contratar um empréstimo, mas recebeu uma proposta do banco ou financeira. Os que fizeram a solicitação de forma proativa formam 55% da amostra.
Um dado que desperta preocupação é que nem todos os consumidores que recorreram aos empréstimos deram a devida atenção às tarifas: 19% não analisaram o peso dos juros e das taxas cobradas nas operações contra 76% que agiram corretamente, e foram mais cuidadosos nesse sentido. Para 52%, as taxas são altas ou abusivas e 36% chegaram a ficar inadimplentes por atrasos nas prestações.
De acordo com a pesquisa, 28% dos entrevistados reconhecem negligenciar o controle do pagamento das prestações dos empréstimos, seja fazendo-o apenas de cabeça (17%) ou simplesmente ignorando a tarefa (11%). Já 68% fazem um controle adequado, principalmente por meio de anotações no papel (29%), planilhas (20%) ou aplicativos no celular (19%).
CNDL